domingo, 11 de setembro de 2016

Autoestima de crianças negras é antídoto contra preconceito

Autoestima de crianças negras é antídoto contra preconceito



Famílias usam estratégias para fortalecer os filhos e ajudá-los a se defender da discriminação
   

Mariana Mesquita

Todo dia é dia de ressaltar a igualdade entre os seres humanos e a singularidade de cada um de nós. Mas, em meio às comemorações do mês da consciência negra, é angustiante saber que muitas crianças ainda sofrem preconceito por conta de sua cor, cabelo e origem étnica. E é inspirador perceber as formas que as famílias vêm encontrando para reforçar a autoestima de seus filhos, formando cidadãos mais críticos e orgulhosos de si.

Ninguém se engane: a necessidade desse suporte começa muito cedo. Letícia tinha 3 anos quando uma coleguinha da mesma idade, na aula de balé, excluiu-a da brincadeira por causa de sua cor. “Ela era tão pequena que não soube nem relatar o contexto. Para mim foi uma surpresa, não imaginava que teria que explicar isso à minha filha, em pleno século 21. Só assumi que somos diferentes mesmo. Que temos esta cor e que isso é bom”, diz sua mãe, a fisioterapeuta Bernadete Pinheiro. Dona orgulhosa de uma cabeleira cacheada, Alice, de 9 anos, vem sofrendo bullying na escola municipal onde estuda, no Ibura. Irritada por ser chamada de feia e de “cabelo de Bombril”, a menina fez um desabafo nas redes sociais e sua mãe, Marina Melo, está em buscas de providências para que a filha retome o prazer de frequentar a sala de aula. Já Antonio tinha pouco mais de um ano e brincava na praça de Casa Forte quando uma babá se referiu ao seu “cabelo ruim” e à sua “cara de pobre”. Aos 8 anos, dias após ver o padrasto ser confundido com um assaltante por uma senhora do bairro, ele comunicou sua decisão à família. Queria pintar o cabelo de louro. E usar lentes de contato azuis.

SUPORTE É NECESSÁRIO

Diante desse tipo de situação, há quem diga que é exagero ou que não há o que se fazer. “O fato é que o racismo acontece desde a mais tenra idade e muitas crianças entram em grave sofrimento psíquico em função de seu pertencimento racial”, destaca Vera Baroni, que é membro do colegiado da Sociedade de Mulheres Negras de Pernambuco. À família, cabe reforçar a autoestima dos pequenos e falar de sua ancestralidade de forma positiva. 

“As crianças precisam aprender a se defender”, ressalta Vera. Isso inclui contar a verdadeira história da África, fugindo dos estereótipos, e oferecer brinquedos, livros e outros objetos que façam referência a essa herança. Mas, mais do que isso, significa ajudar as crianças a fazer uma leitura crítica dos modelos expressos pela mídia e se posicionar contra qualquer forma de preconceito. “É difícil, e o discurso de igualdade às vezes vai ao chão quando, em algumas famílias, se tem vergonha da avó que é preta ou do tio que exerce uma profissão menos valorizada em nossa sociedade”, resume.

Às vezes, o problema acontece entre as próprias crianças. A cantora Isaar de França, terceira de uma “escadinha” de cinco irmãos, sofria bullying por parte do irmão dez meses mais moço. Negro de tez clara e olhos verdes, Esrilton reproduzia em casa o que via na rua e só percebeu os atos que praticava após a adolescência. Isaar passou pelos problemas típicos das meninas negras: ganhava bonecas que não tinham nenhuma característica física em comum com seu fenótipo, amarrava lenços na cabeça para fingir que tinha cabelos longos e lisos, e durante muito tempo foi refém dos alisantes e chapinhas. No fim da década de 1990, assumiu a origem étnica por meio de longos dreadlocks. Hoje, o penteado blackpower é motivo de conversa com a sobrinha Beatriz, de 9 anos, filha de Esrilton. “Ela nasceu com a pele clara e cabelos lisos. Então, eu brincava, comparando nossos cabelos e mostrando que nossos fios são diferentes, mas que está tudo bem em ser assim”, explica.

FONTE: http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/suplementos/jc-mais/noticia/2015/11/22/autoestima-de-criancas-negras-e-antidoto-contra-preconceito-209020.php


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